segunda-feira, 15 de outubro de 2012

 a coluna se espraia...


INVERTEBRA-ME

Invertebra-me
toca a flauta do oco
            costelas de xilofane
            articulações de origame
Invertebra-me
Fluido para verter
sobre o leito a poça
            do próprio corpo
Ereto apenas quando
empilhando os deformes
cacos do amor.


é preciso certa quietude para deixar as palavras namorarem


ENTRE SILÊNCIOS


Manada é coletivo de elefante?
Matilha não é o de lobo,
seria alcateia 
mas não rimaria com "armadilha".
Coletivo de passo não é dança.
Coletivo de palavra não é poesia,
seria talvez palavrório.
Para poesia faltaria
certo silêncio a cingir-lhes,
a poesia como este arco
saltando entre silêncios,
não para ultrapassá-los
mas, por serem o cimo da metáfora, 
tornaram-se o ponto de lançamento.
Quem não ouve silêncio
não vê poesia.
Coletivo de ausência é saudade.
Grito de saudade considera-se,
para efeito de poesia,
como silêncio.
Coletivo de silêncio é poesia.


"...e foi tão corpo, que foi espírito..." (Clarice Lispector)



CORPO ATÉ

O corpo vai até
daí é mais
não outra coisa que corpo
mas corpo mais

O corpo vai até
daí é deserto
não tão vasto que corpo
mas corpo incerto

O corpo vai até
daí é o mundo
não outro fôlego que corpo
mas corpo fundo

O corpo vai até
daí é o porto
não outro destino que corpo
donde só volto morto


O MESMO

O corpo mesmo
todo corpo 
apenas corpo mesmo
mesmo se apenas o corpo
mas não era o mesmo
era outro

A distância a mesma
dois mesmos palmos
entre o seio e o umbigo
a mesma eternidade
mas o eterno mesmo
era outro

O calor mesmo
todo tépido
mesma mão sobre o ventre
ardia a brasa mesma
mas o que ardia
era outro

o corpo mesmo
todo outro
passeando na eternidade outra
soprando a outra brasa
o amor
o mesmo