sábado, 28 de novembro de 2009


GRANDE SARAU DE LANÇAMENTO DO LIVRO


PEDRA CURVA TEMPO


05 de dezembro, sábado, 19h às 22h
Bar Semente


depois das 22h termina o Sarau, mas começa a roda de samba, quem chegar no 2o tempo ainda nos encontra por lá e pode conseguir o livro.


Nos vemos lá!


Uma orelha

...poesia é voar fora da asa...
Manoel de Barros

poesia fora da asa e além mesmo da ideia do alcance da asa. ou antes, ou ainda, nada disso de durante o voo de umas minhas asas flácidas, pesando uma réstia de dolência no canto – pronto: já se lá foi. longe...longe...onde...ali, mas fundo, oh longe! fica o corpo, voa um eco. ventoespalhaletras que bateu, cabelo em pé. mas voa, ou é voado, acolhido quando esquecido de chão. carece mesmo de forma o eco que só não pode é com sem ar, vazio-vácuo. se vazio, se vácuo, o eco murcha. se respira, freme, indizível, na frequência de um tempo que ele inventa. inventa ele. inventa de não inventar muito, põe no quadrado mesmo, papel. já uma teia virou esse papel, pega-gruda. vira para lá, vira para cá, livro de sem história tem esse bom, dá para desler. desler livro ajuda muito a desesquecer, o que facilita uma sabedoria. até a hora que o livro canta, passarinho que traz dentro, e ele voa – não o passarinho, mas o livro, mas o eco do livro com a asa do passarinho que, sem as asas emprestadas, fica lá, deslendo.


texto da orelha do livro PEDRA CURVA TEMPO

Alguns poemas

QUANDO

Não é sempre que te quero.
É só quando a aurora
com olheiras roxas
chega atrasada ao ocaso da noite.

É só quando o tempo
com cabelos desgrenhados
veste sua camisa pelo avesso.

É só quando a lua
comovida por um beijo esquecido
abandona-se no firmamento
em soluços até o meio dia.

É só quando a pena
verga flácida
e o tinteiro resseca por não conseguir grafar adeus.

É só quando mais não me vejo
e o que fora de mim jaz semeando chuva,
plantando, não minha carne, mas minha angústia...

Não é sempre que te quero:
é só quando existo.





RECÔNDITO TEMPO

Porque soubeste, amada minha,
de minh’alma o ardor que desconheço;
porque tiveste, encanto meu,
de minha carne o sabor que nunca dera fruto;
porque foste, vida minha,
a presença que meu peito dilatou para acolher,
recuso-me a dizer-te adeus.

Freme ainda a chama no indizível espaço
oscilante entre o ontem e o sempre:
o recôndito tempo
daquilo que se sonha eterno
mas só se eterniza por amor.




MOSAICO

Que parte cabe à parte
quando o todo se parte?
Quanto do todo se perde
e parte
quando já uma parte
de si se esquece?
Em que parte mora essa parte
que ao todo falta?
E muito falta a cada parte só
para o encontro do todo.
Eu sou todo parte
mas o desejo do todo não me parte,
me junta.
Mas ajuntamento de parte não é todo.
Parte, que é toda a sua parte,
já todo é.
Parte que com outra parte todo torna-se,
parte não é somente:
é todo milagre.

Eu sou todo parte
mas o desejo do todo não me parte,
me junta.
E da vida em cada parte todo sendo,
busco, em parte, não a inteireza
mas uma parte no encontro do todo,
os tantos cacos, as muita partes,
íntegros todos – mosaico.


MIRADA

Pois quando confrontados
com a beleza em sua forma
de sopro,
não mais conseguem
ver os
olhos –
isto é tarefa para o encanto.
Pois quando diante
das cores de uma palheta apenas
intuída,
não mais conseguem
ver os
olhos –
isto é tarefa para o idílio.
Pois quando inquiridos
por um corpo que freme no compasso
de um tempo inumerável,
não mais conseguem
ver os
olhos –
isto é tarefa para o pulso.
Ver na vária verve do senso:
difuso; ampliado.

Enquanto uma noite, com seus olhos de
eternidade,
lança-me sua
mirada.