sábado, 28 de novembro de 2009

Uma orelha

...poesia é voar fora da asa...
Manoel de Barros

poesia fora da asa e além mesmo da ideia do alcance da asa. ou antes, ou ainda, nada disso de durante o voo de umas minhas asas flácidas, pesando uma réstia de dolência no canto – pronto: já se lá foi. longe...longe...onde...ali, mas fundo, oh longe! fica o corpo, voa um eco. ventoespalhaletras que bateu, cabelo em pé. mas voa, ou é voado, acolhido quando esquecido de chão. carece mesmo de forma o eco que só não pode é com sem ar, vazio-vácuo. se vazio, se vácuo, o eco murcha. se respira, freme, indizível, na frequência de um tempo que ele inventa. inventa ele. inventa de não inventar muito, põe no quadrado mesmo, papel. já uma teia virou esse papel, pega-gruda. vira para lá, vira para cá, livro de sem história tem esse bom, dá para desler. desler livro ajuda muito a desesquecer, o que facilita uma sabedoria. até a hora que o livro canta, passarinho que traz dentro, e ele voa – não o passarinho, mas o livro, mas o eco do livro com a asa do passarinho que, sem as asas emprestadas, fica lá, deslendo.


texto da orelha do livro PEDRA CURVA TEMPO